A crônica estava pronta. Eu falava sobre uns assuntos quaisquer sobre Machado de Assis. Porém, depois de ver a exposição, no Museu da Língua Portuguesa, sobre o bruxo de Cosme Velho, tudo mudou. O tema é o mesmo, mas as figurações são outras...
Deparei-me com cadeiras flutuantes, milhares de livros, rolos de papel, retalhos, fotografias, móveis, documentos, manuscritos dos romances: uma aura única. Estava acompanhado de uns queridos amigos, lá encontrei outros. Tudo bem machadiano, tudo muito sutil. Por cerca de uma hora, vi toda a exposição. Num corredor torto, onde as cadeiras estavam ao avesso, as paredes eram tortas, e as pessoas, nauseabundas, caminhavam sem saber direito o que acontecia, eu ia pensando, lucubrando.
Retomo o conceito que se atribui ao romance de 1881, Memórias póstumas de Brás Cubas, considerado como primeira obra realista no Brasil. Usando as sensações experimentadas naquele museu e também com a leitura do romance, o que sempre vi foram caleidoscópios surrealistas avant la lettre, uma profunda discussão filosófica e um bovarysmo latente que só um artista conseguiria elaborar.
O realismo machadiano tem pouco a ver com os princípios europeus do movimento, constituindo-se num realismo à parte, talvez, melhor numa estética simplesmente machadiana, sem vínculos estéticos determinados, pela abrangência e magnitude de sua obra. Então, o que há de Realista em Machado? Talvez nada. Talvez tudo. Porque desvendar um segredo dele é remexer em feitiços muitos velhos e aporéticos.
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