O poema que escolhi é muito estranho. Encontrei um dia desses e resolvi guardar, por causar estranhamento. Ele foi escrito pela Clarice Lispector, e se chama Estrela Perigosa[1]. Parece que é o primeiro e único poema feito por Clarice. É como um rascunho de algum texto. Pelo menos foi o que eu senti.
Estrela perigosa
Rosto ao vento
Marulho e silêncio
leve porcelana
templo submerso
trigo e vinho
tristeza de coisa vivida
árvores já floresceram
o sal trazido pelo vento
conhecimento por encantação
esqueleto de idéias
ora pro nobis
Decompor a luz
mistério de estrelas
paixão pela exatidão
caça aos vaga-lumes.
Vaga-lume é como orvalho
Diálogos que disfarçam conflitos por explodir
Ela pode ser venenosa como às vezes o cogumelo é.
No obscuro erotismo de vida cheia
nodosas raízes.
Missa negra, feiticeiros.
Na proximidade de fontes,
lagos e cachoeiras
braços e pernas e olhos,
todos mortos se misturam e clamam por vida.
Sinto a falta dele
como se me faltasse um dente na frente:
excrucitante.
Que medo alegre,
o de te esperar.
[1] “Estrela Perigosa”, in: BORELLI, Olga. Clarice Lispector – Esboço para um possível retrato. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1981, p. 82 .
Chiba
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