quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

THE BUBBLE

Essa crônica nasceu dia 19 de janeiro de 2009, logo após meu aniversário, que foi comemorado em Saquarema. Foi o último aniversário que passei com Latuf.

O bom de escrever crônicas avulsas é a irresponsabilidade temporal, a possibilidade de romper os limites que o relógio cria e lucubrar fatos sem compromisso com a ordem que eles aconteceram.
Ontem à noite, meu coração parou por alguns segundos. Meus olhos lacrimejaram. The Bubble, último evento da comemoração do meu aniversário em Saquarema foi, sem dúvidas, a mensagem final de que somos irremediáveis.
E irremediável, incurável, foi o dia de ontem. Na companhia mais pacífica possível, passei um 18 de janeiro entre judeus e palestinos, que manifestavam amor, paz, serenidade.
Acolhido, cheguei o mais cedo possível numa das cidades mais lindas que conheço, para abraçar a pessoa mais linda que conheço: meu amigo Latuf, meu eterno orientador palestino, e cumprir a vitalícia sorte de passar meu aniversário com ele.
Avisado antecipadamente, descobri que o casal Roseana Murray e Juan Arias, transfigurações da palavra delicadeza, havia me convidado para almoçar com eles em seu paraíso. Para lá fomos Latuf e eu, ao som da sereia Vitória, contando as mil e uma histórias que somente Sherazade sabe.
O caminho era de pedras, numa casa mágica com cerâmicas míticas. E caminhamos todos por um bosque encantado, cheio de poesias e sutilezas. Vendo o mar, a lagoa e a mata atlântica num uníssono visual, meu coração pressentia que este será um ano memorável.   
Meu telefone, misteriosamente, resolveu não funcionar. Somente Giovani conseguia a proeza de falar comigo. Mais um sinal de que o que eu sentia ao meu redor era o prenúncio da felicidade!
Conversas nas águas de Oxun, partos nas cristalinas águas. Promessas de um futuro disciplinado e coerente... Aquele sítio encantado e encantador serviu como personagem - protagonista - de um dia de Sol.
O gosto do bolo de laranja, a vela da PAZ, as bolhas (mais bolhas) do prosecco: quatro vozes recitavam uma oração. O pedido, aquele nosso, foi feito.
Tive, também, a honra de conhecer o templo dos poetas, onde Roseana, olhando as montanhas, e Juan, vendo o mar, escrevem. Num espelho mágico, vi refletir minha imagem em milhões de outras imagens, vi meus olhos azuis e curiosos descobrindo a verdadeira hospitalidade.
Como pai, Latuf me deu o melhor presente de aniversário: a doação. Doou seus maravilhosos amigos, doou seu amor, sua casa, sua erudição. Como ele mesmo me escreveu, a cada 18 de janeiro, damo-nos conta de que nossas vidas urdem uma trama transcendental. E sou transcendido, elevado, como uma bolha de sabão, a outros níveis, sendo levado pelo vento.
Agora, já em casa, escrevendo, sinto uma imensa gratidão: pelo afeto, por ser afetado. Pois senti ontem que o querer bem é muito além das palavras, dos gestos. A simples energia da recepção, da empatia é o próprio afeto manifestado.
Quando o primeiro dia do meu próprio ano começa banhado em poesia, com pessoas que transbordam uma promessa de luz, penso: eis que a bolha do filme estourou, realmente, em mim. Porque, sinceramente, creio que o amor e a dedicação são capazes de mudar o mundo. E hoje, grato, estou mudado.



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